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Um cordeiro para a celebrar a paz...

Ando ouvindo em tudo que é canto que dois mil e quinze promete. Promete o quê, cara pálida?! Se eu for levar em consideração esses nove primeiros dias, pra lá de frenéticos, tô ferrada! Logo no primeiríssimo dia do ano, meu carro enguiçou... tá bom, né?! Mas, já foram tantos pequenos contratempos e chatices, alguns bem mais complicados que um carro enguiçado, que nem vou me dar o trabalho de enumerá-los. Continuo acordando otimista, como meu pai me ensinou, mas jamais, jamais mesmo, Pollyanna! Vamos descascando os abacaxis diários, dormindo exaustos e, acredite, sem tocar o “dane-se” pra ninguém. Porque parece que virou prática comum mandar o outro se danar e pronto. Resolve?! Não. E se tem uma coisa que detesto nesta vida é deixar coisas pendentes, sem resolução. Não vou empurrar nada com a barriga, todas as vezes que fiz isso, me ferrei. E não vou sair por aí pendurando dane-se ao vento... Vai que ele decide soprar ao contrário... Então, o jeito é encarar a vida de frente, com algum mimimi durante o dia, porque meus nervos não são de aço.

Hoje foi um dia de boas notícias e olha que ainda nem chegamos ao meio-dia. Estou achando promissor... O marceneiro me mostrou a cor original da tábua da sala e, que linda! Um ipê castanho claro escondido numa camada grossa de sinteco e tinta em tons de mogno, sensação nas décadas de setenta e oitenta. Ganhei o dia!

Ganhei o dia noutros dias também, que a vida não é só chateação e eu me encanto e agradeço por todas as coisas legaizinhas que acontecem. É bom pra não pirar. E uma delas foi o pernil de cordeiro que preparei no ano novo. E esse tinha tudo pra dar errado.

Foi logo depois do Natal que decidi ir ao mercado comprar minha ceia de Ano Novo. Sexta-feira dos infernos, de tanto calor! Achei que era malandra e que, sozinha, com alguns funcionários do Mundial, iria desfruta do ar condicionado alheio, flanando sem empecilhos pelo mercado mais lotado da cidade... Hahaha, ledo engano... Quando, nesta vida, o Mundial estará vazio?! Dia de São Nunca, é claro!

Minha intenção era comprar um tender, mas essa também era a intenção de todos os clientes e o tender acabou. Diante da frustração e da constatação de que meu passeio de compras tinha sido uma tremenda furada, dei de cara com uma linda peça de pernil de cordeiro! Mas, há mil anos, fiz um carré de cordeiro que ficou muito ruim. E eu não queria estragar a ceia de Ano Novo e ver estampado nos fogos com todas as letrinhas piscando a palavra azar! O meu e toda família, encalacrada no cafofo, comendo um cordeiro rançoso. Mas quando Antônio viu a peça, também salivou e deu aquela força pra que eu fizesse. Lembrei dos ingredientes que tinha em casa, nos acompanhamentos e decidi arriscar.

Pensei em temperá-lo com vinho tinto, mas não sou fã deste tempero na carne. Ela encorpa o sabor e o cordeiro já tem um sabor pra lá de encorpado. Vinho branco eu não tinha, mas seria melhor. Pedi pro Antônio escolher um. Pagamos e fomos embora. 

Congelei o pernil até o dia 29 e dia 30, fui temperá-lo. Para minha surpresa e falta de atenção, o vinho escolhido era suave e a essa altura da vida nem imaginei que Antônio não soubesse que, para temperar a comida só se usa vinho seco... Ai, que raiva! Mais raiva ainda quando o cidadão respondeu que nem se tocou, pegou o primeiro vinho barato que viu. Ah, mas na hora de escolher o que vai beber, se perde nas gôndolas escolhendo calmamente a próxima degustação... Voltar ao mercado nem morta! Hora de improvisar e arriscar... 

Só de raiva, tasquei um gole do vinho branco e doce, doce, doce, no meu cordeiro, pedindo que ele tivesse piedade de nós e ficasse delicioso. Completei os temperos com o bom e barato vinagre de vinho branco de todo dia, azeite, uma colher de chá de sal grosso, pimenta do reino, cominho, tomilho e alecrim. Rezei e guardei na geladeira acreditando que podia dar certo. A raiva passou e rimos daquele improviso.

No dia 31, preparei uma salada de lentilhas com azeitonas pretas, palmito, tomate cereja, azeite e balsâmico. Fiz um arroz branco, sem enfeites e assei meu cordeiro pacientemente por três horas, num fogo bem baixinho. Pra completar, fiz um molho de hortelã pra servir com o cordeiro. E já que eu não tinha mais nada a perder, arrisquei uma receita de cabeça: hortelã, suco de limão e sal. Deu certo e casou super bem com a carne e a salada.

À meia-noite brindamos, nós quatro, dois cachorros e um gato. Agradeci o ano que passou e que finalmente havia acabado e dei boas vindas ao Ano Novo contemplando o foguetório da vizinhança com alegria e esperança de viver um ano bom!

Quanto ao cordeiro, devo dizer, sem modéstia alguma, que ficou incrível! E por alguns instantes me senti uma cozinheira de verdade! Me deu até vontade de me inscrever num programa tipo “Cozinheiros em Ação”, “Jogo de Panelas”... Mas, a vontade já passou. Definitivamente, não tenho paciência para competições.

Mas, decidi que em dois mil e quinze vou correr muitos riscos com as minhas panelas e tantos outros com a minha vida. Se dizem, que quem não arrisca não petisca, informo aos que desejam que me dane (sempre tem um ou mais, né!) que quero o banquete completo e não prometo nada, pois promessa é dívida e já me bastam as do cartão de crédito! Então, que venha dois mil e quinze, renovando a vida e fazendo que ela seja boa para todos!


Feliz Ano Novo!


Comentários

  1. A prática é mesmo a amiga da perfeição, cada vez melhor a escrita e as receitas e quer saber ? Eu também preciso me arriscar mais, nunca comi e nem fiz um cordeiro! Ah! não pode né? P´ra quem vivia no mato e já comeu até tatu e capivara...Aí, boa dica pro blog Made, receitas exóticas, rã, coelho...Ah e o dane-se pegou fundo na minha alma eu ainda soltao muito e nem são prá pessoas diretamente, mas para algumas situações e aí eu acho que funciona.... :) bjsssss e

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  2. Rose, acho que o segredo do cordeiro é temperar de um dia para o outro e assar lentamente. Tenta! Quanto às outras carnes, não sei se tenho coragem de cozinhar um coelhinho! rsrs...
    E, quanto ao dane-se, acho que estourei minha cota ano passado! Esse ano estou um pouquinho mais moderada, hahaha! Mas, devo confessar que quando não resisto e mando alguém se danar, faço com vontade e força! Funciona muito! rsrs... Beijo!

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