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Hoje eu vou defenestrar você.

O caldo entornou, sujou fogão, chão, cho entornou, sujou fogç, panelas, queimou a mão e o dedo do pé. Fogo alto que num instante levantou fervura e se perdeu. Veio um cheiro acre, talhado, perdeu-se tudo. O destino é lixo.

Tudo engano que minha tolice só percebeu depois de tantos que já sabiam que aquilo não passava de propaganda enganosa. Produto com defeito de fábrica, desses que decorrem de um aborto mal sucedido, feito com restos de terceira linha.

Vendia felicidade, conjugando beleza, harmonia e espírito livre. Mas, nas suas engrenagens havia um líquido pegajoso que parecia toxina botulínica misturado com ferrugem. Acho que era veneno.

Já lhe amei.

Já lhe admirei.

Já lhe fui grata.

Hoje, somente  o desprezo. Não quero nada na minha vida com prazo de validade vencida.

Me feri nas pontas soltas que não vinham descritas na embalagem do produto. Mas também fiz questão de amassar cada uma delas, já que não serviam para nada, além de machucar.

Na embalagem estava escrito que era inquebrável, inoxidável, inodoro e incolor. Mas já de cara nota-se opacidade e é possível enxergar através do sorriso plastificado o veneno enferrujado que veio lambrecando a carcaça, caindo pelos cantos. Também é possível notar que, pela baixa qualidade do material utilizado, o produto está arranhado, tem marcas profundas.

E poderiam ter descrito na embalagem, que devido às flutuações de humor o mesmo poderia se tornar um perigo! Um doido varrido, desvairado, rodopiando sua ira, cego de ódio por não ter sido amado. Bastaria uma frase e todos entenderiam: PRODUTO TRANSTORNADO.

E olha, vou te contar: ele até veio com manual de instrução, mas era longo, mentiroso, chato e cheio de indiretas. Ai, como cansa!

Beleza não lhe faltava. Enquanto houver botox e bisturi tudo estará resolvido. Não há nada nessa vida que uma maquiagem permanente não resolva. Mas ele, apesar de modificado em laboratório se julgava o belo dentre os mais belos. E não havia sujeito que lhe enfiasse engrenagem adentro que a diferença entre o feio e o bonito é apenas um ponto de vista.

O prazer em apontar, com suas unhas bem feitas, o que lhe parecia feio lhe rendia dias de bem estar que nenhuma tarja preta era capaz de conseguir.

E foi assim, nessa ânsia por uma imagem perfeita, que pode ser linda pra você, mas que para mim é bem questionável, que quase quebraram a fábrica. Produtos saídos fora do padrão não podiam ser aceitos... Não pode ser gordo, nem ter cabelo crespo, tem que ser loiro e nariz achatado, jamais!

Refizeram a beleza, mas esqueceram de consertar a cabeça... por fora não, tá linda! Por dentro!!! E dá-lhe ansiedade, insônia e ansiolítico.

Muitas vezes, tentei catar o produto num canto,  pensei que pudesse lhe ajudar a encontrar a paz perdida em algum lugar do seu travesseiro. Eu sei que ele sente dores. É desamor. Muitos já o deixaram de lado, esquecido. Ou assim como eu, jogaram no lixo. Ele quer berrar uma felicidade que não existe, tá todo mundo vendo, só o espelho que não lhe mostra... ou vai ver que mostra, né. Ele só não quer admitir que é igual a todo mundo, tem seus dias bons e seus dias ruins. E que a vida é assim e não há mal nenhum nisso. Mas, prefere achar que é invejado pelo MUNDO INTEIRO e vive num mundo colorido, todo embolorado por dentro.

Acho que vou escrever ao fabricante, pedindo que ele estude um pouco mais antes de lançar outras encarnações... ops, versões. Estudar é bom. Fundamental. Evitará o constrangimento de proferir inverdades que lhe causarão rugas!  

Por exemplo, pedirei que inicie pelas doenças neurológicas e descubra que elas podem causar alucinações. Basta um google, afinal, pra um produto de tão baixa qualidade, informações superficiais seriam suficientes. Porque fica feio escrever num manual de instrução que um aneurisma acometeu alguém por causa de um “espírito obsessor “ . É no mínimo leviano. Caso de polícia! E tenha certeza: manchará sua reputação.

Mas, sabe... numa rápida reflexão, melhor deixar mesmo o produto quebrado, sem uso, sem fim. Não serve mesmo pra nada, veio estragado de fábrica e por mais que haja tentativa de melhoria ele será sempre muito burro!


Comentários

  1. Produto que não vale nada o destino é a lixeira! Adorei o texto!

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  2. Valeu! Aproveitei que hoje é dia do gari passar por aqui e a tralha já foi embora!

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