Ele decidiu que o polvo seria preparado naquele domingo. Não era dia especial e o polvo já estava ali, congelado há meses esperando a nossa mudança para meia-água. Seria nosso almoço de comemoração pelo início da grande e demorada reforma da nossa casa. Seria o pé direito num cafofo de quarto, cozinha e banheiro. Nós quatro, o gato e dois cachorros no quintal doidos pra fazer parte da trupe. Mas o meses correram e nossa reforma não começou quando planejamos.
O atraso se deu por trabalhos extras, doenças, desânimos e consequentemente, crise. Aquele momento em que, se um não quer dois não brigam ou brigam-se os dois porque um não quis... Às vezes a vida fica confusa e nessas horas seria bom que o tempo parasse pra gente se rearrumar. Mas o tempo, esse apressado, corre sem dó nem piedade e antes que o polvo perdesse a validade, era melhor prepará-lo.
Fiquei de assistente e ele abriu um vinho antes de iniciar os trabalhos. Lembrei de uma mistura para petit gateau esquecida há meses na dispensa. Casa sem graça não tem bolo. Então, já era hora de mudar! Chamei a caçula pra entrar na roda e ela, imediatamente se pôs a untar forminhas de alumínio. Também fui sua assistente. Ajudei na leitura da receita e naquela "última batida" na massa... coisa de mãe guiando a cria...
Minha casa andou meio embolada e minha vida bem bagunçada com aquela sensação letárgica pós trauma que não passava nunca.
Mas era domingo, sorvete no freezer, vinho embaralhando as ideias, o cheiro do bolo, o cheiro de mar, o riso frouxo de um dia sem sol e aquela vontade de levar os planos adiante, como antes, quando ainda era só uma ideia.
Lavei a louça, dei uma força e o todo trabalho sujo foi ele quem fez. Limpou e cortou o polvo, coisa que me recuso aprender! Cortou cebola e mergulhou com o bicho que chiaram na pressão por um bom tempo. Na água roxa que se fez, ferveu a massa por nove minutos. Depois de escorrida foi só enroscá-la nos tentáculos refogados com alho e azeite, salpicou uma salsinha pra finalizar...
E assim, nós quatro juntos, um gato passeando pelos pés, uma chuva preguiçosa lá fora, o petit gateau com sorvete pra completar e aquela sensação de que tem dias nessa vida que não há o que melhorar.
Eu não sei o que aconteceu naquele domingo, já havia perdido a esperança de começar a reforma neste ano. Mas já na segunda-feira, após mais um, dos muitos telefonemas para o mestre de obras, veio a notícia que eu nem esperava mais: nossos planos seriam postos em prática na semana seguinte!
E a vida respondeu,porque ela só precisa de um pouquinho da nossa atenção e disponibilidade,né?...
ResponderExcluirÉ! Bastou dizer "bora fazer" que aconteceu!
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